Você é um blogueiro ou um autor?

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O ato de escrever para Internet corre o risco de virar colagem. Não no sentido dos plagiadores que vivem de CTRL+C/CTRL+V, mas no sentido de que dez idéias pesquisadas e agrupadas não formam uma idéia original, e estamos carentes de idéias originais.

Onde fica a bagagem cultural de cada um? Para quê assistir milhares de filmes, ler toneladas de livros, conhecer todo tipo de pessoa, se quando precisamos escrever sobre uma música que gostamos partimos para pesquisar vida e obra do autor, colocando da inspiração inicial ao número de versões gravadas por cantores canhotos da Birmânia Oriental, e esquecemos de dizer o que NÓS achamos da música?

Estou vendo textos e artigos cada vez mais complexos e elaborados, informativos e completamente sem alma. A impressão é que o autor se esconde por trás de sua biblioteca, gerando conteúdo informativo mas e sem nenhum toque pessoal.

Entendam, blogueiros, não queremos só fatos, fatos nós conseguimos no Google. Ou, com sorte, na Wikipedia. Nós queremos alma. Muito provavelmente um teste pedindo para correlacionar dez posts de dez blogs diferentes, frequentados por um leitor, resultaria em um monte de notas zero.

Sinto falta de um estilo, e essa é a diferença entre o Veríssimo e a Joaninha Querência, de Miracema do Norte, que acabou de criar um Blig e espera ser descoberta pela Cia. Das Letras em mais ou menos uma semana. Note que estilo não é escrever errado. “naums” e “miiiga kicetá venduuu hoji??” não é estilo, é analfabetismo. Para escrever errado direito primeiro você tem que aprender a escrever corretamente. Vide os textos do Judão e do Tupi da Taba.

Antes da Internet, o Veríssimo nem precisava assinar seus textos, todo mundo reconheceria sua marca. Idem Carlos Eduardo Novaes. Rubem Fonseca, entre outros, também estão no mesmo barco. Entre os cronistas diários, um texto do Paulo Francis era inconfundível, assim como um do Elio Gaspari. As colunas de TV do Rogerio Durst quando escritas por um substituto ficavam gritantes em sua diferença.

Na TV um bom exemplo é a dupla Alexandre Machado / Fernanda Young. N’ Os Normais era evidente quando o epsiódio era escrito por um ou por outro, embora os créditos sempre viessem em nome dos dois. O Humor do Alexandre, criador d’ A Vingança do Bastardo é inconfundível.

Na internet, entretanto conto nos dedos os blogs dos quais um texto pode ser pinçado e o autor identificado após dois ou três parágrafos. A impressão que tenho é que os autores não maturaram o bastante para criar um estilo pessoal ou, no caso dos mais antigos, não se deram esse direito, em nome da objetividade, da agilidade, de Cthulhu, sei lá. Um efeito interessante gerado por isso é que o supremo culto de personalidade que é o blog gera lealdade de leitores para o blog, não tanto para o blogueiro. Não é comum você ver por aí “autor-convidade fulano de tal”, e sim “fulano de tal, do blog tal”.

Ou seja: O sujeito cria um blog de sucesso, com excelente visibilidade, mas não consegue capitalizar para si o sucesso, mesmo com o blog sendo uma iniciativa totalmente pessoal. Eu entendo quando falamos de um daqueles blogs-repartição em tempo de eleição, com 68 membros ativos, 123 colaboradores eventuais e metade da população da Guiné Equatorial como “Membro VIP”. Só que não faz sentido se referir ao Alexandre Inagaki do Pensar Enlouquece como “Alexandre Inagaki, do Pensar Enlouquece“.

Alguém se refere a “J.K. Rowling, Autora de Harry Potter” em grupos de fãs de Harry Potter? Alguém usa “Gene Roddenberry, criador de Star Trek” em materiais destinados a trekkers? Então por que diabos nos blogs brasileiros todo mundo precisa de um anexo ao nome para ser reconhecido?

Disse nos blogs brasileiros pois “lá fora” temos Cory Doctorow, Xeni Jardim, Madoxx, John Dvorak e vários outros, jornalistas e blogueiros que são individualmente reconhecidos, independente dos veículos em que escrevem.

Eu credito isso à necessidade de ser aceito e à preocupação em não ofender nenhuma sensibilidade. Isso gera textos politicamente corretos, inofensivos e com pouco ou nenhum tempero. Convenhamos o Jamie Oliver não iria muito longe fazendo programas só sobre frango grelhado.

Acho isso tudo uma grande oportunidade perdida, principalmente por quem pretende viver de escrever para veículos “de verdade”. O blog será sua última chance por muito tempo de exercer seu próprio estilo, experimentar e descobri-lo. Nenhum foca ganha uma coluna, nenhuma matéria policial pode começar como O Falcão Maltês, e seu editor vai demiti-lo se se referir à Petrobras como Petrosauro, por mais merecido que seja. O Blog é uma oportunidade e tanto, fornece um feedback dos leitores maior do que qualquer outra mídia, é excelente para polir seu estilo, exercitar suas variações e, essencialmente, aprender a escrever.

Sim, Virgínia, embora haja gente vendendo livretos “Aprenda a escrever como um Mestre em 30 segundos”, a dura realidade é que ninguém escreve direito se não:

1 – Ler muito

2 – Escrever muito

A primeira parte é fácil, a segunda demanda motivação. Escrever para guardar na gaveta é um processo muito longo, embora funcione. Já escrever e publicar (possível hoje com os blogs) garante críticas instantâneas, que fatalmente irão ajudar a moldar seu estilo, apontar seus erros e aprimorar seus acertos.

Com isso os publicitários, estudantes de jornalismo e similares realizarão o sonho de qualquer diretor de redação, um estagiário que sabe escrever. Isso, meus caros, é muito raro e muito valorizado. Eu mesmo nunca vi um.


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