E o Alex Castro gosta de picadura

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Calma.

OK, eu explico. “picadura” é como chamam, em Cuba, o fumo para cachimbo. E não, eu não sabia disso até alguns minutos atrás. E o que diabos tem o Alex Castro a ver com Cuba? Ele foi para lá, passou um mês, realizando um trabalho bancado por duas bolsas de pesquisa, e aproveitou para escrever o eBook Radical Rebelde Revolucionário.

O MeioBit recebeu uma cópia do livro, mas fugiria muito do nosso foco lá. O Leo então perguntou se eu queria resenhar o livro no Contraditorium.

Hum. Intelectual. Que fuma cachimbo. Passeando em Cuba bancado por universidades para estudar a Disneylandia do Socialismo? Isso sempre dá naqueles livros chatíssimos onde o cara republica propaganda do Partido, ou então é escrito por um anticomunista ferrenho que vai passar o tempo todo falando das atrocidades da Revolução. Todo livro sobre Cuba cai nesses dois modelos.

Respondi que a princípio não queria, isso é chutar cachorro morto. Fazer resenha de um livro que sei que não vou gostar é implicância pura e masoquismo.

Só que eu detesto ser pré-julgado, e imagino que o Alex também. Mesmo que tivesse 99% de certeza do que iria encontrar, abri o PDF. Afinal, se fosse o que eu imaginava iria deixar de lado, não publicaria e como se diz por aí, ninguém se machucaria.

O livro é excelente, li de uma sentada só, mesmo com isso soando altamente comprometedor em um post com esse título.

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São 155 páginas com crônicas deliciosas, onde ele conta seu dia-a-dia na terra de Fidel. Ele descreve um povo como qualquer outro. Alegre, triste, otimista, conformado, assustado, orgulhoso, envergonhado.

Ele encontrou Dolores, a bibliotecária mais sensual desde a Barbara Gordon, descobriu que os cubanos também usam o Jeitinho Brasileiro e aprendeu que quem decide o menu é o burocrata do Governo que escolhe quais produtos colocar nas lojas naquela semana. Passou por saias justas com vendedoras de abacaxi, apaixonou-se por vários pés (longa história) e enganou a polícia para tomar sorvete barato.

Alex alterna momentos líricos com o mais puro sarcasmo. Vejam o trecho abaixo. Não é qualquer um que capta essa cena.

A coisa mais interessante da estrada foi ver policiais cubanos uniformizados singelamente pedindo carona aos carros que passavam. Fiquei dividido entre achar lindo e deprimente, mas acabei achando lindo. Tem uma poesia que não sei bem explicar.

Por outro lado, solta pérolas do sarcasmo como:

A praia, Mar Azul, era simplesmente linda. Se essa foi a que sobrou pros cubanos, fico me perguntando como devem ser as somente para turistas, aquelas com policiais uniformizados nas entradas exigindo passaporte dos visitantes. Fidel Castro, se fosse vivo, jamais permitiria uma situação dessas. Afinal, a Revolução não foi justamente pra evitar que Cuba se tornasse o bordel dos Estados Unidos?

Ele comete vários pecados que farão com que a Academia odeie seu livro, e desejasse estar sob o Regime Cubano, onde Alex seria preso e seus livros proibidos. Ele cita o prosperidade artificial graças ao Regime Soviético, conta que os jornais oficiais são subsidiados, e que o povo os usa como substituto de papel higiênico, conta dos táxis para cidadãos, proibidos por lei de levar turistas, e constantemente parados pelo polícia, e conta até algo que acho difícil de acreditar. Se fosse um livro de um autor histérico anti-comunista, eu descartaria:

Annie, minha companheira de viagem, é norte-americana, branca, loira, olhos azuis. Leonardo é negro, forte, alto, musculoso, bailarino profissional. Em um pequeno percurso de vinte minutos andando pelas ruas de Havana Velha, somos parados quatro vezes por policiais diferentes. Pedem seu carnê de identidade, perguntam quem ele é, o que faz, de onde nos conhece, pra onde está nos levando, anota nossos nomes e o dele. Falam grosso e arrogantemente, como qualquer policial, mas nos deixam ir.

Isso mesmo. Há racismo em Cuba, e é oficial. Que orgulho do Brasil, onde isso não existe!

Mesmo assim, Radical Rebelde Revolucionário não é um ebook-denúncia. Nem tudo é ruim, nem tudo é um dramalhão mexicano. Alex não tem uma agenda oculta através do livro. Ele consegue falar mal de uma coisa, e na próxima crônica falar bem de outra. Mostra que por detrás da propaganda e da antipropaganda há gente. E gente é sempre interessante

Recomendo muito a leitura do livro. Pode ser comprado aqui neste site e custa apenas 200 pesos cubanos não-conversíveis, ou R$20, ou praticamente um salário-mínimo cubano (192 pesos).

[atualização]

Só vi agora, mas o Slonik fez uma resenha do livro, dia 17, fechando exatamente com a mesma piada. Eu estou ficando com medo dele.

[atualização 2 – a missão]

O Alex vai fazer um lançamento do livro em Sampa, neste sábado, 21 de Julho/2007, no bar Canto Madalena, na Rua Medeiros de Albuquerque, 471, Vila Madalena. Não percam. Eu vou perder, infelizmente não poderei ir, mas termino com um hai-kai:

Alex seu livro em Sampa vai lançar / Sem Fidel, é um mel / quero ver em Cuba lançar

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