Quem ri por último é retardado mas ao menos ainda ri

Compartilhe este artigo!


Sarah Silverman é uma comediante americana considerada ofensiva por um monte de gente que só consegue entender o básico das piadas. No vídeo acima ela conta de uma jóia sensacional, uma pedra que só é encontrada na ponta do cóccix de bebês etíopes. Ela tenta descrever a tal jóia, diz que é fantástica, mas que tem um certo problema moral, os trabalhadores que desossam os bebês são muito maltratados.

O espectador mediano só consegue enxergar “crueldade contra bebês”, enquanto o espectador inteligente lê claramente a crítica à pseudo-preocupação que algumas pessoas finger ter, afinal comprar diamantes “limpos” continua sendo um gesto totalmente egoísta, você gasta o salário de um ano de um infeliz em uma pedra e ainda se sente moralmente superior.

O povo moralmente superior em geral é o primeiro a se ofender com qualquer coisa que tenha camadas, seja uma boa piada, seja um ogro, seja uma cebola. E isso não depende de inteligência. O TED (Tecnologia Entretenimento, Design) é uma conferência criada por Chris Anderson (não o da Wired) que reúne gente muito inteligente fazendo apresentações fantásticas dos mais variados temas. Não é brinquedo, o ingresso custa US$6 mil.

Na última edição resolveram chamar a Sarah Silverman, que fez seu show habitual. Uma hora ela começou a falar que estava na moda adotar crianças retardadas, para mostrar que pessoa maravilhosa você era. Só que uma criança assim seria trabalho pra vida inteira, ela não queria. Então para mostrar que era uma pessoa mais maravilhosa ainda (sem se comprometer por muito tempo), iria adotar uma criança retardada doente terminal.

A maior parte da platéia ficou chocada. Um grupo riu, mas o resto, que estava ali para se sentir o máximo e que provavelmente invejam a admiração social obtida por quem adota crianças retardadas  terminais entendeu como ofensa pessoal.

Chris Anderson chegou a twitar criticando a Sarah Silverman, algo extremamente deselegante para com sua convidada. Poucos saíram em sua defesa, até mesmo porque ninguém quer se queimar com o Anderson e ser barrado no TED.

Uma das poucas que vi defendendo foi uma leitora, desconhecida. Ela reclamou da falta de senso de humor, da dificuldade das pessoas em entenderem a quem estão direcionadas as críticas. Também lembrou que o alvo NUNCA foi a criança deficiente, e sim o pessoal que as usa como muletas sociais.

A leitora também lembrou aos indignados que a Sarah Silverman havia se comprometido, uma semana ANTES do TED a participar do Twenty Wonder, uma maratona de eventos em prol de portadores de Síndrome de Down em Los Angeles.

Recentemente Family Guy anunciou que iria ao ar um episódio com uma personagem com Síndrome de Down. Na história Chris Griffin se interessa por Ellen, que questionada sobre o que seus pais faziam responde que o pai era contador e a mãe ex-governadora do Alaska.

A piada foi direto para Sarah Palin, política republicana, conservadora, ex-governadora do Alaska com cinco filhos sendo um portador de Down.

A reação foi épica. A mídia conservadora caiu de pau, Sarah Palin emitiu um comunicado em conjunto com sua filha Bristol (mãe solteira aos 15 anos, belo exemplo dos Valores Familiares da ex-governadora) chamando os criadores de Family Guy de “babacas sem coração”.

Quem se deu ao trabalho de assistir ao episódio viu algo completamente diferente. Nele a personagem com Down NÃO é o foco da piada. Ela não é mostrada de forma paternalista, não é mostrada como deficiente coitadinha, nem como o anjo de candura que os comerciais da APAE tentam vender.

Ellen é uma garota independente, decidida, com personalidade, dominadora e que trata o pobre Chris como cachorro.

Já na casa dela, Chris tenta agradá-la de todo jeito, e prepara um sorvete. Claro, não consegue (ela nunca está satisfeita). Perde a paciência, joga o pote no chão e desabafa:

“OK, chega! Não importa o quanto você seja gostosa, não agüento ser tratado assim! Eu costumava ouvir que gente com Síndrome de Down era diferente do resto de nós, mas vocês não são! Vocês não são diferentes, são um bando de babacas como todo mundo!”

Para quem quer inclusão, integração, foi algo lindo de se ver. Para o pessoal metido a bonzinho que gosta de tratar deficientes como retardados, foi algo terrível, pois uma personagem como a Ellen não desperta piedade, não desperta pena. Não pode ser manipulada politicamente nem excluída de forma segura do resto da sociedade. Ela é só uma pessoa comum e pessoas comuns não contam, para essa gente. Eles não acharam graça.

Ao contrario da atriz Andrea Fay Friedman, 39 anos, portadora de Síndrome de Down e dubladora da personagem no episódio, além de modelo para seu visual. Diante da polêmica, Andrea declarou:

“Creio que a ex-governadora Palin não tem senso de humor. Penso que a frase ‘sou filha da ex-governadora do Alaska’ foi muito engraçada. Imagino que a palavra seja ‘sarcasmo’. Na minha família achamos que rir é bom. Meus pais me criaram para ter um senso de humor e levar uma vida normal”

Eu concordo plenamente com a Andrea, e muita gente me acha retardado por isso.

PS: Para um excelente apanhado sobre humor e moralismo politicamente correto, visite o site do Danilo Gentili e procure pelo post do dia de hoje, 19/2/2010.



Compartilhe este artigo!