Tire a mão da minha língua, Deputado André Moura

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A Etimologia é um ramo fascinante do conhecimento humano. A formação das palavras e a evolução dos idiomas é bem mais interessante do que a versão bíblica, acredite. Fora que rende histórias divertidas de xenofobia, ignorância e vergonha alheia. Os franceses são especialistas nisso. Tentando impedir a entrada do anglicismo “Computer”, inventaram um tal de “Ordinateur”.

O problema é que Computer vem do verbo francês Compute que por sua vez vem do Latin Computare.

O grande erro da xenofobia linguística é achar que idiomas são entidades estanques que surgiram prontos. DE NOVO: A Torre de Babel é só uma lenda!

Uma das histerias brasileiras preferidas na Internet era denunciar o “barbarismo” Monetizar.  Chegava a dar desgosto o pessoal vomitando xenofobia sem fazer o dever de casa. Monetizar não vem do inglês Monetize. Ambos vêm do Latin Moneta, que significa moeda, dinheiro. Pombas, será que nenhum desses histéricos ouviu falar do Fundo MONETÁRIO Internacional? Quanto a ser neologismo, aparecer em um livro em português de 1858 tá bom?

Idiomas evoluem absorvendo e doando expressões. Culturas com mais tradição tecnológica exportam expressões tecnológicas, culturas mais musicais exportam expressões musicais, e por aí vai. Só que ninguém explicou isso pro Deputado André Moura, do PSC, eleito pelo único Estado brasileiro com pretensões automobilísticas.

Ele propôs um Projeto de Lei (PL 4854/12) que pune com CADEIA quem usar expressões em idioma estrangeiro sem colocar ao lado e em destaque a tradução. [nota: O texto ACABA de ser alterado e a detenção de 3 meses foi removida]

PL 4854/12: Torna obrigatório que as nomenclaturas
expostas em todo o território nacional, que
tenham em seu conteúdo palavras em outros
idiomas, possuam tradução, conforme
especifica.

Sim, você fez um CARAPALMA quando leu isso.

É ridículo uma loja de shopping colocar “SALE 50%” na vitrine? Com certeza, do mesmo jeito que é ridículo um casal do Bronx abrir uma sorveteria chamada Häagen-Dazs, que não quer dizer nada, mas parece estrangeiro então deve ser bom. (no caso é). Não me consta que os EUA tenham perdido sua identidade cultural por causa disso. Nem Sinatra cantando música brasileira acabou com ela.

No Projeto do Deputado:

No Brasil, segundo o censo do IBGE de 2010, existem cerca de 14
milhões de analfabetos. E se quase 10 por cento da população não domina a
língua mãe de seu país, imagina uma segunda língua?

Se eles são analfabetos não faz diferença. Eu sou analfabeto em relação a 99% dos idiomas do planeta.

O objetivo desta proposição não é de erradicarmos os termos citados
acima e sim tornar obrigatório a inserção junto aos referidos termos a tradução
do enunciado em português.

Afinal brasileiros são burros demais para deduzir o significado do termo, procurar por conta própria ou colocar no Google [número grande escrito errado] né, deputado?

O estrangeirismo se concretiza no Brasil e ameaça a língua portuguesa.
O fato é que o único patrimônio vivo está perdendo sua independência, além
de reproduzir as desigualdades da sociedade brasileira.

Não, não se concretiza. O estrangeirismo faz parte de todo idioma. O Japonês tem até um alfabeto, o Hiragana, só pra palavras que não existem em Kanji. Palavras estrangeiras surgem, são modificadas e absorvidas, o idioma GANHA com isso. Sua mulher usa sutiã, sua avó usava soutien. Todo mundo que usa computador sabe o que é um mouse. Muitos não sabem que significa Camundongo, que aliás vem do Quimbundo kamundóngo.

Se estrangeirismo promovesse desigualdade Self-Service seria restaurante de rico, nobre Deputado.

Estamos assistindo uma descaracterização da língua portuguesa, onde
faz-se uso do estrangeirismo em abundância. O uso excessivo de palavras em
inglês, que somados com problemas de vocábulo, desvalorizam a língua.

Uai, era estrangeirismo, agora virou anglicismo? Sua ianquefobia está aparecendo, Deputado. Aliás, estude a origem do vocábulo, Ianque é um termo reconhecido pela Academia Brasileira de Letras. Obviamente surgiu do nada, como todas as palavras, certo?

Além de dificultar a comunicação, o uso indiscriminado de palavras
estrangeiras, constrange e confunde quem não a domina, pois a maior parte
das pessoas não compreende a mensagem e fica à margem do processo de
comunicação, criando mais uma diferença social entre os que falam bem e os
que falam mal.

Aqui fica evidente que o já mencionado legislador não frequenta comentários de portais. Nem fóruns de games [jogos]. O vocabulário médio do Internauta (outro termo que surgiu do nada, claro) é composto de 17 palavras, 11 são palavrões usados pra xingar o PT, 3 pra Globo e o resto é “vai mim segue”.

É comum estarmos diante de um estabelecimento comercial e nos
depararmos com placas com os seguintes enunciados: “Drive Thru”, “Fast
Food”, “delivery”, “closed”, “open”,”happy hour”, “play ground”, dentre outros.

Primeiro, eu nunca vi um lugar que não seja turístico com OPEN ou CLOSED, mas tudo bem. De resto… sério, deputado, cê acha MESMO que alguém que usa “happy hour” tem dificuldade com o significado do termo? E não é mais “play ground”, se escreve tudo junto. Na verdade todo mundo fala “Play”, todo mundo MESMO.

Ninguém vai falar “Serviço de entrega” se Delivery é um termo mais curto com o mesmo significado. Me irrita ver essa geração ainda nas fraldas chamando bicicleta de Bike mas a minha geração chamava de Camelo, não faz sentido mas era mais curto que biii ciiii clee taa…

Aliás a galera dos Rolezinhos (que aliás tem origem francesa. A palavra, não a galera, que aliás vem do catalão-mas divago. Voltando: A turma dos rolezinhos não parece ter nenhum problema de comunicação para achar os Shopping Centers, que em inglês se chamam Malls, diga-se de passagem.

Políticos adoram legislar sobre o que não compreendem, basta ver os deputados americanos tratando de temas científicos. Aqui temos toneladas de exemplos, um dos meus preferidos é o deputado que queria controlar CONSUMO por decreto, definindo quantos Reais você poderia gastar por mês, mas o André Moura ganhou uma menção honrosa. Sua preocupação é nobre, bem-intencionada, inútil, desastrosa e só serviria para atrasar nosso idioma, forçando um vocabulário congelado no tempo.

Aliás, Deputado André Moura, visitando seu site percebo que “bem-vindo” está escrito errado e Vossa Excelência tem uma “fanpage” no Facebook. Não deveria ser página de fã? OK, tanto faz, me preocupa é ler  seu Projeto de Lei e dar de cara  com:

Parágrafo único. A tradução a que se refere o caput deste artigo deve
ser do mesmo tamanho que as palavras em outro idioma expostas pelas
empresas e como título principal.

Caput? Sim, eu sei que é terminologia jurídica, mas se há algo que  “constrange e confunde quem não a domina, pois a maior parte das pessoas não compreende a mensagem e fica à margem do processo de comunicação, criando mais uma diferença social entre os que falam bem e os que falam mal”, é a Língua Latina. Pode perguntar a qualquer um que estudou essa desgraça no colégio.

Fonte: Tuinto do Victor.



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